RIO - A cena se repete em duas praças, ambas incluídas no perímetro de Unidades de Ordem Pública (UOPs): de um lado, guardas municipais; de outro, a desordem. No fim da tarde da última quarta-feira, cinco agentes e dois carros da Guarda Municipal estavam na Praça General Osório, junto à Rua Teixeira de Melo, em Ipanema. Bem perto dali, na Rua Jangadeiros, um flanelinha agia livremente no estacionamento do Rio Rotativo, e a rampa para deficientes em frente a um restaurante estava, mais uma vez, bloqueada por dois carros — como O GLOBO já havia noticiado dez dias antes. Já na área da UOP da Tijuca, uma hora e meia antes, dois guardas faziam o patrulhamento da Praça Vanhargem, onde os motoristas, para ampliar as vagas de estacionamento, não pouparam a esquina da Rua Felipe Camarão.
Oito meses depois da inauguração da primeira UOP e de a prefeitura investir R$ 44 milhões na implantação de quatro unidades — sem falar nos custos de manutenção, estimados em cerca de R$ 9 milhões por ano em cada uma delas —, a cultura da ordem ainda não pegou nessas áreas. Faltam campanhas educativas, e o carioca resiste, apesar dos 62.906 veículos multados e 1.796 rebocados até o dia 20 deste mês no perímetro das UOPs da Tijuca, do Centro, do Leblon e de Ipanema. Mas o coordenador do Laboratório de Etnografia Metropolitana do Ifcs/UFRJ, o antropólogo Marco Antonio da Silva Mello, diz que não há como pensar em mudança de comportamento do carioca, se o poder público não fizer a sua parte.
Problemas migram para áreas vizinhas
As quatro primeiras UOPs contam com um efetivo de 1.094 guardas municipais, distribuídos por turnos. Para Mello, as regras só vão vingar quando o poder público passar a tratar bem o cidadão:
— A prefeitura está cobrando. O que está oferecendo? Oferece transporte coletivo de qualidade? E por que permite a particularização do espaço público? Deixa fecharem ruas com cancelas e guaritas, colocarem grades em calçadas e milícias controlarem territórios.
Ele lembra que, na história urbana do Rio, a tentativa de disciplinar os espaços públicos é antiga: começou na gestão do prefeito Pereira Passos. $das dificuldades, acrescenta, é que o carioca vê esses espaços como sendo do Estado, e não seus.
Responsável pelas UOPs, o secretário Especial da Ordem Pública, Alex Costa, trata como um desafio mudar a cultura do carioca de resistir ao ordenamento da cidade, mas prefere não fixar prazo:
— Esse é um processo longo de convencimento. O carioca tem de entender que a ação da prefeitura é permanente e que o objetivo não é multar, mas ordenar melhor a cidade.
Além das tentativas de burlar a fiscalização nas áreas das UOPs, há infratores que migram para a vizinhança das unidades. Na terça-feira passada, pouco após o meio-dia, por exemplo, dezenas de camelôs se concentravam junto às grades do Campo de Santana, na Avenida Presidente Vargas.
Também fora, embora próximo da área da UOP do Centro, ambulantes em situação irregular se concentram em ruas coladas ao camelódromo da Rua Uruguaiana. Na Buenos Aires e na Senhor dos Passos, entre Uruguaiana e Rua dos Andradas, eles não se limitavam às calçadas, espa$se pelas pistas. Mais adiante, em frente ao prédio-sede do Detran, na Avenida Presidente Vargas 817, o mau exemplo era dos motoristas, que estacionavam junto ao meio-fio ou em fila dupla — neste caso, com o pisca-alerta ligado, aguardando vaga num estacionamento próximo.
— Nossa intenção é criar outras unidades no Centro — diz Costa.
Centro é onde há maior resistência
O monitoramento das UOPs, feito pela Seop, indica o Centro como a área de maior resistência. Na tarde de terça-feira, repórteres do GLOBO contaram sete automóveis parados, com o pisca-alerta ligado do lado esquerdo da Avenida Rio Branco, entre a Presidente Vargas e a Almirante Barroso. Na esquina das ruas do México e Santa Luzia, havia um camelô vendendo bolsas. Na Almirante Barroso, um carro de passeio ocupava uma vaga para táxi. Outro estava estacionado na esquina da Rua do México com o porta-$aberto, para permitir que um camelô vendesse quentinhas.
Do Centro para o Leblon, os problemas no miolo e nas vizinhanças da UOP também não dão trégua. Na Rua Dias Ferreira, apesar da repressão, há motoristas que insistem em parar em fila dupla. Ligam o pisca-alerta e aguardam passageiro. Na terça-feira, alertado pelo guarda André Antunes, o publicitário Jorge Luiz Moraes fechou a mala do carro e saiu.
— Parei só para desembarcar uma pessoa. Abri a mala por alguns instantes, mas já estou saindo. Não estaciono em fila dupla — garante.
Segundo Antunes, a Dias Ferreira e o trecho da Avenida Ataulfo de Paiva em frente à padaria Rio-Lisboa e ao restaurante Talho Capixaba são os pontos da UOP do Leblon onde os motoristas mais param irregularmente para embarque e desembarque:
— Nosso trabalho é mais educativo. Só multamos quando o motorista não está no carro ou não concorda em sair. Se fôssemos multar todos, seria um infinidade de multas.
Presidente da Associação de Moradores do Leblon, Evelyn Rosen$se diz preocupada especialmente com a migração da desordem para a vizinhança da UOP. Até na Avenida Visconde de Albuquerque já há camelôs, conta ela:
— Que projeto é esse? É para mudar de lugar as irregularidades?
Moradora de Ipanema há 64 anos, a aposentada Roselene Soares sentiu uma melhora, embora insuficiente, dentro do perímetro da UOP. Ela, no entanto, critica o que chamou de falta de preparo dos guardas:
— Eles conversam muito, não coíbem as infrações como deveriam.
Mais otimista, o presidente da Associação Comercial e Industrial da Tijuca, Jaime Miranda, sente que a UOP freou a ação de camelôs e dos distribuidores de panfletos. Em relação ao estacionamento irregular, porém, a situação só vai melhorar, diz ele, se houver transporte coletivo de qualidade e a construção de edifícios-garagem.
— No entorno da Praça Saens Peña, há 1.500 lojas e salas — diz ele.
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