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domingo, 6 de abril de 2014

O dilema da Guarda Municipal

Panorama Carioca
Gilberto Scofield Jr. gils@oglobo.com.br

O dilema da Guarda Municipal

Fico feliz com a aprovação do Plano de Cargos e Salários para a Guarda Municipal pela Câmara, esta semana. Toda categoria precisa de um plano desses, com critérios claros para a ascensão na carreira. Especialistas dizem que o debate sobre a proteção dos guardas, que andam apenas com cassetetes, continua inconclusivo, mas eu não tenho opinião formada sobre o assunto. A categoria teve 6% de aumento.

Guardas municipais na Praça Saens Peña em 18/04/2011 Foto: André Teixeira / O Globo
Guardas municipais na Praça Saens Peña em 18/04/2011ANDRÉ TEIXEIRA / O GLOBO
Isto posto, preciso destacar uma coisa: desde que assumi a editoria Rio, a inoperância ou a inutilidade da GM é uma das mais frequentes reclamações dos cariocas. Condena-se a tentativa da guarda de tirar o corpo fora em todas as situações, o que é decorrente de um problema gravíssimo no Rio: a estrutura de segurança tem vários comandos diferentes, em várias esferas de governo. Então a reclamação do cidadão é a seguinte: ele vê um carro na calçada, fala com a GM e o cara responde “isso é com a CET-Rio”. O sujeito vê um arrastão em andamento, fala com a GM de plantão (invariavelmente em grupos ou duplas, em animados bate-papos, dizem os leitores), e a resposta é “isso é com a PM”. O sujeito fala que tem alguém pichando um muro ali perto e o guarda diz “não tenho como evitar”. É um jogo de empurra que deixa o cidadão impotente.
Nos EUA, um guarda é uma autoridade de segurança para qualquer situação. Resolve de problemas de vizinhos violentos a trânsito. Na quarta-feira, às 17h, fui a Copacabana e dei de cara com uma viatura da Guarda Municipal na esquina da Av. Nossa Senhora de Copacabana com a Rua Santa Clara. O bairro, àquela hora (e eu não estou acostumado a ir a Copa nessa hora da tarde), parecia o entorno da BRT Transoeste em Santa Cruz — caótico. Camelôs se espalhavam pelas ruas, especialmente no trecho da Nossa Senhora com Siqueira e com Figueiredo, onde o movimento ferve. Pequenos grupos de sujeitos suspeitos circulavam descalços de olho em idosas e jovens dando mole com celular, aquele furto anunciado. Carros parados em fila dupla, com gente dentro, atravancando um trânsito já congestionado. E lá estavam os dois guardas na caminhonete, com cara de paisagem, como se nada estivesse acontecendo.
Quando a GM foi criada, em 1992, ainda na gestão Cesar Maia, o serviço de “proteger bens, serviços e instalações municipais" foi terceirizado, o que provocou reações de todos que defendiam, com razão, que a segurança pública era uma prerrogativa de Estado. Em 2009, Eduardo Paes assumiu a prefeitura e tornou a GM estatutária, transformando os guardas em funcionários públicos, com todo o inferno e o céu que esta condição representa. Eram 4,8 mil guardas (5,4 mil funcionários ao todo), que custavam R$ 119 milhões anualmente (valor da época; aplicando os 33% de inflação de lá para cá, dá R$ 158 milhões). Hoje, são 7,5 mil guardas (8 mil no total) e o orçamento anual é de R$ 289 milhões.
Agora que os guardas têm seu plano e reajuste, a GM tem uma tarefa maior. Conquistar o carioca para a sua relevância. Por anos nossa PM construiu para si uma imagem de truculência e corrupção. Apesar dos esforços de mudança orquestrados pela Secretaria de Segurança no estado, com uma pacificação feita por soldados recém-formados, ainda há ceticismo. É um passivo que demora para mudar porque é cultural: enxergar a autoridade policial como protetora, não como truculenta ou corrupta. A GM não pode ir pelo mesmo caminho.
O fato é que, apesar de toda a campanha #foracabral, da pressão do ex-governador que fez uma administração desastrosa/picareta e agora posa de arauto da moralidade ou de opositores doidos para ver o circo pegar fogo na tentativa de ganhar dividendos políticos em ano eleitoral, o ex-governador Sergio Cabral fez um governo que é muito melhor, perto dos governos que o Estado do Rio teve há pelo menos 20 anos. Os indicadores mostram e é preciso má vontade (ou oposição ferrenha) para não ver isso. Avançou-se no metrô, no bilhete único, na pacificação — seu grande trunfo —, em parcerias com os governos federal e municipal que renderam grandes obras de infraestrutura e a aplicação de programas sociais petistas, em expansões escolares em tempo integral, enfim, um governo que, se não foi um espetáculo, foi melhor do que os últimos. E eu nunca votei nele.
Mas o maior inimigo de Cabral foi o próprio Cabral. Trata-se de uma trajetória de decadência frente à população que começou com a queda do helicóptero que revelou suas relações mais que próximas com o controverso Cavendish e Eike Batista, suas declarações arrogantes sobre categorias queridas da população, como professores e bombeiros, seus sumiços e helicópteros particulares, episódios turbinados pelos desafetos políticos, claro, que isso é briga de cachorro grande. Mas como diz a versão popularizada de Plutarco: “A mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta.” Os guardanapos na cabeça não permitiram isso. E Pezão terá que se esforçar em dobro na campanha deste ano para recuperar o terreno perdido.


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